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Sobre os modos de produção da Mostra Hífen de Pesquisa-Cena

hífen para tempo_contínuoPor Diogo Liberano |

Recentemente, dando uma entrevista sobre a terceira edição da Mostra Hífen de Pesquisa-Cena, que acontece de 2 a 18 de dezembro no Rio de Janeiro, a jornalista Clarissa Macau me perguntou sobre como a Mostra estava sendo realizada, por meio de qual patrocínio. Disse a ela que o principal patrocínio não se traduzia em termos monetários. Disse que se eu tivesse que dar um nome àquilo que – de fato – faz a Mostra acontecer, provavelmente o nome desse patrocínio seria parceria. Ou afeto.

É o filósofo Peter Pál Pelbart quem reconhece que “vamos aprendendo a selecionar o que convém com o nosso corpo, o que não convém, o que com ele se compõe, o que tende a decompô-lo, o que aumenta sua força de existir, o que a diminui, o que aumenta sua potência de agir, o que a diminui, e, por conseguinte, o que resulta em alegria, ou tristeza”. É desse afeto alegre, dessa paixão que nos move rumo à realização de alguma coisa, que a Mostra Hífen é feita.

Eis um modo de produção, não? O desejo – tornado comum – de realizar alguma coisa. No caso desta Mostra, não haveria possibilidade de realizá-la caso não houvesse essa paixão. Que fique claro que não estou desmerecendo o valor traduzido em dinheiro. Ele também é determinante, porém, ele não é a única força que faz algo acontecer. E isso é fundamental se quisermos, de fato, especular outros modos de produção. Não tenho dúvida que sem o amor, sem a partilha de um mesmo desejo, eu não tenho dúvida que este projeto seria inviável.

Artistas trabalham munidos de paixão. Eis um aspecto interessante que a criação artística oferece às reflexões sobre a economia da produção cultural. Como é possível mensurar em valores monetários aquilo que é de ordem imaterial? Que balança pesa a densidade dos afetos? Se aceitarmos que o afeto é uma potência que nos mobiliza rumo à ação, como seria possível calcular sua efetiva ação? Mais do que especular traduções de afetos em cifrão, o que gostaria nesta curta reflexão é tentar dar a ver a força que não se mede apenas em dinheiro. É esboçar a beleza do invisível que, no entanto, permanece vivo no entreolhar e no entre mãos.

Estou falando sobre a equipe de criação da Mostra Hífen de Pesquisa-Cena. Se uma equipe de criação – prefiro este nome à ficha técnica – é aquela responsável por realizar um determinado projeto, e se essa mesma equipe não está no projeto unicamente por conta do cachê que recebe para realiza-lo, o que então a faz existir? Que outro pagamento pode existir no mercado profissional que não apenas o dinheiro? Reitero que minhas reflexões não se prestam a desmerecer o aspecto monetário do labor artístico e de produção. Não se trata disso. O que me interessa é observar que existe uma química na criação artística que extrapola a técnica, o saber e o know how. Existe uma matéria da qual o trabalho artístico se origina que diz respeito ao invisível e é nela que – me parece – reside sua vitalidade.

Nesta terceira edição da Mostra Hífen, se fosse possível traduzir o preço de cada artista e profissional de nossa equipe, sem dúvida se abriria um problema de prestação de contas, afinal, o valor dessas pessoas extrapola aquilo que o nosso orçamento poderia abraçar. Ou, perceberíamos que o projeto conseguiu realizar algumas coisas que ele não tinha dinheiro para realizar. Seria um caso de desvio? Seria um caso de corrupção? Não, não, nada disso. É tudo culpa dos apoios e das parcerias. É tudo culpa da paixão.

Escrevo essas linhas não para me acostumar que o dinheiro não é a tônica do meu trabalho. Ele é necessário, mas quem dita a intensidade de sua presença sou eu e não ele próprio. Escrevo para lembrar ao dinheiro que, sem ele, ainda é possível realizar muita coisa. Mais que isso, eu penso, eu escrevo estas reflexões para lançar aos donos do capital um desafio: como medir em moeda o invisível nascido do encontro e da comunhão? Como fazer equações a partir da força produtiva que emana de um coração?

Eis um desafio. Eis uma demanda que com esta edição da Mostra Hífen de Pesquisa-Cena queremos hifenizar: modos-de-produção.

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Diogo Liberano é curador e diretor artístico da Mostra Hífen de Pesquisa-Cena

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