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entrevista de isadora malta a joão cícero

(Abaixo, a entrevista que a diretora da pesquisa-cena Primavera Leste concedeu ao crítico João Cícero Bezerra. Clique aqui para mais informações sobre a peça.)

 

JOÃO CÍCERO: Por que o tema da violência?

ISADORA MALTA: Antes de tudo, porque era necessário, para mim, tocar nesse tema para ir de encontro a uma forma de discurso e de produção de ação que estivessem muito distantes. Sou uma pessoa medrosa, tenho muito medo da violência, de sê-la e de sofrê-la. Uma das formas de usar esse medo a meu favor era montar Primavera. Montar um trabalho que, a princípio, nunca havia pensado em fazer dessa forma e mesmo depois eu não optaria por isso.

 

J.C.: Qual a relação entre a dramaturgia e a direção em Primavera Leste?

I.M.: Ainda estou tentando descobrir. Sei que essa relação começa com uma amizade (entre Isadora e o Diogo Liberano, dramaturgo do espetáculo), mas não sei até onde ela vai. Através da minha direção, passei por momentos de aderência total à dramaturgia e de negação às imposições que ela me fazia, ou poderia fazer. No final das contas, percebo que o texto cênico tenta formal e sensivelmente ser autônomo à dramaturgia. Mas existem ainda muitos buracos nesse encontro.
J.C.: Como foi o trabalho com os atores? Quais as demandas trazidas por eles para o trabalho da peça?

I.M.: Trabalhar com eles foi leve, muito leve! De fato, foi o trabalho de ator mais leve que já fiz. Digo isso pois não havia o peso de nenhuma necessidade de construção da atuação deles na peça. Eu estava tentando perceber com calma como se daria o trabalho com esse elenco que tinha tantas fragilidades. O Lucas Canavarro e o Renan Brandão nunca haviam trabalhado na construção de um espetáculo como atores, o João Marcelo há tempos tinha largado seu trabalho como ator e a Dominique Arantes estava no meio deles precisando se reinventar a cada minuto. Eu sabia que precisava ter calma e confiava no texto que tinha em mãos, e principalmente, sabia do que eu queria falar. Isso me dava confiança para saber que o que precisávamos acima de tudo era construir uma escuta atenta e honesta e que isso nos levaria à cena.

Minha metodologia na sala de ensaio era o corpo deles. Foi muito contraditório no início, pois esse é o trabalho que menos estava pensando em uma dramaturgia física, mas foi o que mais me exigiu uma pesquisa sobre a estrutura daqueles corpos. Com a continuidade desse trabalho, quando levantamos a cena, eu vi o acontecimento do texto de uma perspectiva muito sensorial e percebi que ali estava a “chave”.
J.C.: Comente acerca da simultaneidade de ações dentro do espetáculo.

I.M.: A simultaneidade foi uma escolha por manter presencialmente o fluxo dos acontecimentos em cena, a todo momento. Ela foi um meio que encontramos de tornar a violência física, indo de encontro aquilo que mais nos amedrontava, o vazio. O vazio e a solidão de estar em cena foram necessários para a criação de Primavera e a simultaneidade passou a ser uma opção formal de criar esses atravessamentos.

Categorias: Blog. Tags: Isadora Malta e Mostra Hífen de Pesquisa-Cena.