TRADUZIR

ENTER: AS MICRO-TENDÊNCIAS DE HELOISA BUARQUE DE HOLLANDA

Ao longo de sua trajetória intelectual, a crítica cultural Heloísa Buarque de Hollanda tem se interessado por movimentos artísticos que a mesma denomina de micro-tendências. Tais micro-tendências, tematizadas pela professora na palestra Arte e Contemporaneidade, no Primeiro Tempo_Festival, se manifestam de modo esparso no cenário cultural e conservam características comuns. Dentre os traços característicos, destacam-se dois complementares: de um lado, o caráter marginal de determinadas expressões culturais, que não recebem nem o crivo nem o apoio (institucional e financeiro) da mídia para que aconteçam; de outro lado, a presença persistente do risco, uma vez que, em geral, as micro-tendências apontam para inovações artístico-culturais que ainda não foram legitimadas pela crítica.

Dentre as micro-tendências observadas pela professora, a poesia ocupa um lugar central. O interesse da crítica por este gênero artístico provém de alguns traços sócioeconômicos que a própria atesta no genêro. “Eu adoro poesia”, afirmou Heloísa na palestra do Tempo_Festival, “porque poesia não vende, não tem mercado. Eu nunca vi poesias mais vendidas [como ocorre no ranking dos melhores livros de ficção e de não-ficção]”. A poesia apresenta, portanto, uma liberdade e uma resistência. Na realidade, a liberdade da poesia não a permite enquadrar-se nos parâmetros mercadológicos.

A relação entre Heloisa e a poesia já rendeu inúmeros frutos interessantes. É da professora, por exemplo, a coletânea 26 Poetas Hoje, lançada em 1976 como um conjunto significativo da poesia marginal produzida no Hoje da década de 70. A coletânea se tornou emblemática, tendo sido pivô de muitas polêmicas entre os letrados na época. O termo marginal, cunhado pela própria autora, sublinhava a incompatibilidade dos poetas com o mercado editorial. Surpreendentemente, poetas considerados marginais na década de 70, como Chacal e Wally Salomão, ao longo do tempo, se tornaram referências culturais cujas obras são respeitadas por muita gente.

Em Agosto de 2009, 33 anos após a publicação de 26 Poetas Hoje, a palestrante do primeiro TEMPO_Festival, Heloisa Buarque de Hollanda, lançou ENTER, uma antologia digital composta por poemas (escritos, desenhados, performados, musicados) de 37 novos autores. A professora assim comenta a antologia digital: “Hoje tenho a convicção de que, para pensar a literatura hospedada na internet, é absolutamente impresncindível que se pressione a tecla ENTER, ou seja, se aceite o rito de passagem que é entrar em outra lógica de percepção, experimentar novas relações com a palavra, com a comunidade de autores, com a ideia de literatura e de critica literária, com as idiossincrasias e paixões da vida literária na web.”

A proliferação dos computadores pessoais (PC´s) a partir da década de 80 e a posterior disseminação da Internet permitiram o desenvolvimento de uma nova relação do indivíduo com a palavra. O uso da palavra tornou-se mais ágil e os novos poetas não se encontram mais isolados do mundo em seus gabinetes. Ao contrário disso, os novos canais de comunicação disponíveis na Internet, como os blogs, permitem uma interlocução constante do poeta com o leitor, de modo que aquilo que é escrito possa ser imediatamente lido e criticado. O poeta não precisa também da editora para chegar aos leitores: os blogs colocam emissor e receptor em contato estreito, conforme se pluga na net. Desse modo, as novas tecnologias de informação e de comunicação criam, por sua vez, novas práticas literárias, práticas do Hoje que é os anos 2000, era que, segundo Heloisa Buarque de Hollanda, não é marcada pela imagem (não estamos mais em uma “Civilização da Imagem”), mas por uma palavra copiada, colada, traduzida, postada, linkada, blogada etc.

Dentre as novas práticas literárias estão os keitai shosetsu, romances de celular, a nova febre entre os japoneses adolescentes.

Por aqui, é possível ficar por dentro do que rola de mais interessante Hoje acessando a antologia ENTER, em que encontram-se textos, sons, imagens e vídeos de poetas como Diana de Hollanda, Omar Salomão e Michel Melamed (que esteve também no TEMPO_Festival falando de sua Tetralogia).

Acesse a marginalidade!

Categorias: Blog. Tags: ENTER, Heloisa Buarque de Hollanda e Literatura.