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SIROCO (OS VENTOS QUENTES VARREM O MÊS DE DEZEMBRO)

Acordei no dia seguinte da instigante discussão sobre os destinos do contemporâneo com um poema na cabeça. Um poema e uma imagem.

O poema é do Mestre-Catatau,Leminski:

“já me matei faz muito tempo
me matei quando o tempo era escasso
e o que havia entre o tempo e o espaço
era o de sempre
nunca mesmo o sempre passo

morrer faz bem à vista e ao baço
melhora o ritmo do pulso
e clareia a alma

morrer de vez em quando
é a única coisa que me acalma”

É tempo de fatigados corações, baços, pâncreas, olhos e mãos. É tempo de cansaço. Morrer de vez em quando  esfria nossas cabeças. Como diria o filósofo: “o corpo já não agüenta mais”. É esse mormaço escravizante do mês de Dezembro.

Uma imagem do tempo:cena clássica de “Morte em Veneza”. Uma cidade molestada pela epidemia de cólera e  a violência dos ventos quentes do ‘Siroco’  inflamando desejos e epidermes. Tadzo ri, simplesmente ri. Impassívelmente o jovem  sorri e brinca na praia. O intelectual de meia-idade como de costume se senta na cadeira para apreciar seu menino, o ideal perseguido de eterna beleza. Esgotado e escravizado pelas exigências de uma perseguição inglória, de uma imagem que sempre escapa e escapa outra vez, o intelectual sucumbe. Seu rosto é derretido pelo tempo. Tempo físico e tempo filosófico. O calor faz escorrer a maquiagem desfigurando seu rosto em um caldo grotesco e amorfo. Suas lágrimas turvam-se.  Ele está doente. Enfraquecido e esgotado por uma opressiva vontade de eternidade.

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