Para inaugurar minha colaboraração nesse blog fiquei pensando em muitas das dimensões que o tempo pode ter, de um modo geral, na arte e na vida: a constituição histórica da arte, a consolidação de poéticas e de linguagens artísticas, a produção efetiva de um artista como rastro no mundo, a ação do tempo em nossos corpos e sua ênfase constante em nossa finitude… A questão é que o tempo sempre nos escapa, ele nunca nos é suficiente, mas age em nós, incólume, sem cessar. Acho que essa letra de música do Chico Buarque, “Tempo e Artista“, comenta bem precisamente (e por que não dizer, lindamente) essas questões.
Tempo e Artista
Chico Buarque
Imagino o artista num anfiteatro
Onde o tempo é a grande estrela
Vejo o tempo obrar a sua arte
Tendo o mesmo artista como tela
Modelando o artista ao seu feitio
O tempo, com seu lápis impreciso
Põe-lhe rugas ao redor da boca
Como contrapesos de um sorriso
Já vestindo a pele do artista
O tempo arrebata-lhe a garganta
O velho cantor subindo ao palco
Apenas abre a voz, e o tempo canta
Dança o tempo sem cessar, montando
O dorso do exausto bailarino
Trêmulo, o ator recita um drama
Que ainda está por ser escrito
No anfiteatro, sob o céu de estrelas
Um concerto eu imagino
Onde, num relance, o tempo alcance a glória
E o artista, o infinito
Para responder um pouco à proposta que serviu de ponto de partida para esse post, segue um pensamento que gostaria de compartilhar e colocar em discussão: acho que nós artistas fazemos arte para, de algum modo, encapsular o tempo e assim podermos agir em nossos trabalhos, como o tempo age em nós.