Devires, transformações. Comunicação a uma academia, espetáculo resultante de uma parceria entre Roberto Alvim e Juliana Galdino, apresenta um texto pouco conhecido de Kafka. No espaço, escuridão, cenário mínimo, no qual se destacam somente uma grande cabeça de um animal presa à parede e um guarda que está sempre presente, armado. A iluminação deixa entrever aos poucos uma forma híbrida entre humano e macaco, que narra sua história de vida.
Difícil dizer o que é mais curioso, se o tortuoso processo de se tornar humano narrado por aquela criatura, ou sua apresentação, com trajes e modos tão tradicionalmente ocidentais. O processo parece ter sido concluído, pois fala em tempos passados. Ele diz que não procurava exatamente liberdade, que não se trata disso. Aceitação, portanto? Inclusão em um meio. Através da falha nas tentativas de imitação, de representar humanos que ali algo se cria. Um híbrido, uma criação. Resultado de reações operantes por erros, tentativas, assimilações. Em blocos, gradativamente; uma individuação. Um indivíduo, portanto. E, no entanto, ainda diferente, estranho.
A descoberta mais espantosa foi, ainda assim, quando finalmente percebi que era a atriz Juliana Galdino que interpretava o símio-humano. Me lembra de coisas que só são possíveis no palco e que nele se concretizam, funcionando na (re)criação de tempos e espaços singulares.