Um dos espetáculos mais bem falados da última edição do TEMPO_FESTIVAL, Don Quijote (de Tom Frankland, Keir Copper e Último Comboio) girava em torno de um convidado especial por dia — um performer convidado que, sem saber de nada que se passa na peça até algumas horas antes, acaba sendo o próprio Dom Quixote. Álamo Facó e Débora Lamm participaram desta experiência e nos presentearam com um pequeno relato de como foi estar no centro da obra de Miguel de Cervantes!
— Débora Lamm —
Fomos apresentados na véspera, nos exatos 20 minutos em que divulgávamos o espetáculo para a agenda cultural do RJTV. Entrevista concluída e compromisso firmado: Eu chegaria as 17hs na Biblioteca Parque Estadual, centro do Rio de Janeiro, onde seria a estreia brasileira de Don Quijote!
Quando meu amigo César Augusto me convidou para estar em cena com Tom Frankland e Keir Cooper em associação com o Último Comboio, sem titubear aceitei, justamente por não fazer a mais vaga idéia do que aconteceria a partir dessa minha disponibilidade. Imediatamente fui tomada por um desconforto corajoso que seguiu comigo até poucos instantes do último aplauso de Sábado 11/10 em que juntos estreamos.
Quatro horas antes do público entrar na tenda, Tom começava a narrar passo a passo em inglês, totalmente tranqüilo e sem pressa, o trajeto que percorreria no decorrer da cena. Aos poucos, depois de alguns minutos do início do espetáculo, sentada em um suposto trono, eu seria revelada por trás de um pano.
Um livro, palitos de madeira, cavalos de brinquedo e um ventilador eram os materiais disponíveis para que, lentamente, eu pudesse me transformar no Dom Quijote daquela noite. Tom seguiu explicando que num determinado momento eu teria que pedir, da minha maneira, o auxílio da platéia para que com fitas adesivas e caixas de papelão criassem a minha armadura. Vestida como a personagem, eu abandonaria o espaço acompanhada de algum espectador, aleatoriamente escolhido por mim que assim como eu, a partir dali, não veria mais o mesmo espetáculo que a maioria.
Sentados em uma van, que prontamente estava na porta para nos resgatar, eu (envolta no papelão) e meu Sancho Panza , com um jogo de tabuleiro nas mãos, seguimos para um bar na lapa onde pedi uma caipirinha e ele um suco. Tínhamos então 32 minutos contados no relógio, insisti para que ele pedisse algo para brindarmos já que tremia de nervoso e repetia que só havia aceitado o convite, pois havia algo em mim em que ele muito confiava. Satisfeita com o que ouvi, retribuí dizendo que não faria nada que não fosse de seu concedimento. Ele recusou o drinque, disse que era da Igreja e tomando seu suco, cada vez mais calmo, foi entrando comigo no jogo proposto pelos Ingleses que começava por um simples “Digam olá um para o outro”. Lemos juntos relatos de Dom Quixotes contemporâneos, picamos páginas do livro escrito por Cervantes, as jogamos pra cima e por fim, tomados por aquela atmosfera, extraí dele cinco sinceros atos que, assim como o nosso personagem principal, ele faria para melhorar seu mundo.
De volta ao local onde a peça se aproximava do fim, a bateria pulsante que anunciava nossa “deixa” para estar de volta à cena, se misturava com aplausos especialmente calorosos do público que delirava. Impressionada com a diferença de temperatura daquela tenda que em quase nada se parecia com aquela que tínhamos deixado, sentei Sancho Panza, no trono cênico, antes ocupado por mim, que em voz alta se manifestou como um verdadeiro Dom Quixote! Era o fim daquela aventura que se encerrava com uma chuva de papéis picados celebrando aquele encontro.
Próximo passo: Um brinde no mesmo bar com Inez Viana e Álamo Facó, que também tiveram essa oportunidade rara, para trocar sensações dessa jornada. César Augusto é nosso convidado. Obrigada querido amigo! Palmas para o TEMPO_FESTIVAL!
— Álamo Facó —
Participar do Don Quijote, no TEMPO_FESTIVAL, foi uma experiência lunar.
Estava numa semana Quixotesca, indo a lugares inusitados, com amigos de Barcelona. Cheguei na Biblioteca Parque às 9 da manhã e os atores me passaram instruções para uma incursão labiríntica pela peça.
Como já vinha de uma semana atípica, com experiências inusitadas, senti que deveria reagir à peça com a mesma disponibilidade. E assim a coisa se deu. Disseram-me Dom Quixote e não tive tempo pra retroceder à proposta.
O grupo inglês foi tão acolhedor, que eu lhes chamei Sancho Pança. Durante a jornada-peça, encontrei uma parceira, Dulcinéia-Quixote-Pança, que me levou ou eu levei-a para um café a dois.
De espírito modesto, à primeira vista, minha nova parceira mostrou-se uma aventureira capaz de desembainhar a espada à faculdades e transportes públicos, nos Moinhos do Rio de Janeiro e melhorar o Mundo a sua volta!
Um sonho lunar participar dessa peça e sempre uma necessidade essencial participar do TEMPO. Fazer um festival desse porte numa cidade latino-americana é, sem dúvida, uma jornada Quijotesca. Espero que os ventos soprem sempre a favor!